AMBIENTES VIRTUAIS DE ENSINO APRENDIZAGEM
E CONTEXTOS DE TRABALHO

Juliane Corrêa

Professora da Faculdade de Educação/UFMG

Juliane@fae.ufmg.br




Questão problematizadora: como promover a formação de redes colaborativas de aprendizagem, mediadas pelo uso da Internet, que desenvolvam competências que não se restrinjam ao âmbito pessoal e atinjam o âmbito institucional. Ou seja, o resultado final de trabalhos como esse teria que, de fato, qualificar o grupo envolvido para renovar suas estratégias de aprendizagem, sua prática profissional e, assim, renovar a dinâmica institucional. E, para isso, teríamos que investir no desenvolvimento de processos significativos de aprendizagem e de competências colaborativas. Processos esses mediados pelas tecnologias da informação e comunicação que permitam dialogar com os contextos reais de inserção profissional.


A utilização dos recursos tecnológicos depende do contexto institucional no qual estamos inseridos, e hoje, diria que o uso que fazemos dos diferentes espaços de formação que participamos, também depende do contexto institucional no qual estamos inseridos, depende das relações cotidianas de trabalho que vivenciamos. O clima sócio-cultural de nossos contextos de trabalho é extremamente individualista, fragmentado, excludente. No cotidiano dessas relações de trabalho cada um deve garantir o seu território, o seu projeto, a sua unidade, aprofundando, cada vez mais, o isolacionismo (HARGREAVES, 1998). Com isso, não pretendemos justificar tal conduta e ser condescendente, mas estar alerta para perceber que não basta decretar as mudanças de tais procedimentos, ignorando as estruturas que as produzem. Sabemos que avançar em direção a processos mais colaborativos de trabalho requer tempo para tomar decisões, supõem negociações. Normalmente, apenas dialogamos com nossos pares e, é claro, de acordo com uma organização social piramidal, o que irá determinar o fluxo de informações, quem recebe “o que” e “quando”, quem aparece em cena e quem fica nos bastidores. Ainda falta a competência e sensibilidade solidária (ASSMANN, MO SUNG, 2001), que permite aplaudir o colega de trabalho que, independentemente dos referenciais que utiliza, das qualificações que possua, está ali persistindo, está ali ao seu lado. Temos o hábito de aplaudir um palestrante desconhecido, que possui titulações, mas nada sabemos de sua prática, ainda sem termos trocado uma palavra com ele, sem a possibilidade de dizermos o que pensamos sobre ensinar, aprender, viver. Temos de pensar de que serve a tecnologia, os cursos de formação se o gesto não pode ser feito, se a palavra não pode ser dita, se o outro não pode ser aplaudido, se o humano não se faz presente. De nada adianta termos milhares de possibilidades e ferramentas para a interatividade se não temos o sujeito dessa interação. E aqui, não poderia deixar de mencionar que estamos vivenciando mudanças organizacionais que promovem uma intensificação do trabalho, uma crescente precarização das condições de trabalho, de acordo com os referenciais de produtividade que visam a inserção institucional na lógica do mercado em detrimento da ênfase na formação humana e nos projetos sociais.

Os processos significativos de aprendizagem implicam que o sujeito seja capaz de relacionar e contextualizar experiências e discursos, de modo a compreender a falta de sentido, compartilhar e incorporar novos sentidos, enfim, impregnar a vida cotidiana de sentido, dar sentido ao que fazemos cotidianamente, ressignificando nossas ações. Para vivenciar esse processo permanente de negociação de sentidos é necessário aprimorar nossa capacidade de expressão. Temos que avaliar nossas estratégias comunicativas, aquelas que utilizamos no jogo das interações pessoais e profissionais.

Sabemos que na prática docente prepondera um fluxo comunicacional unidirecional, onde o professor apenas transmite informações para o aluno, impossibilitando o diálogo, a interação, mantendo os alunos como meros receptores de informação. O mesmo ocorre no cotidiano de nossas relações sociais e profissionais, ainda hoje acreditamos no dom da fala, acreditamos que alguns nasceram predestinados a falar e outros a ouvir, a serem eternamente platéia. Reverter essa crença é difícil, implica em abrir mão do lugar de detentor da verdade, implica em permitir a fala do outro. Romper esta cultura seria vivenciar em nossos contextos de trabalho e de aprendizagem elementos da educação libertadora de Paulo Freire, baseada na educação dialógica, que possibilita a troca, a inclusão do outro e no fluxo comunicacional bidirecional, que permite um relacionamento de reciprocidade.

Seria possível imaginar a construção do conhecimento, nos diferentes ambientes virtuais de aprendizagem, descolada dos processos comunicativos vivenciados em relações interpessoais concretas? Acredito que não, pois aprender implica em abrir-se ao mundo e aos outros, num processo permanente de troca e transformação.

Hoje em dia, as novas tecnologias adquiriram tamanha versatilidade e disponibilidade cooperativa que, muitas vezes, pensamos que poderiam estabelecer por nós as conexões necessárias para o trabalho colaborativo. Mas não é possível, porque o gesto a ser feito depende da rede de significados que vamos cotidianamente tecendo nas nossas relações sociais, depende de pessoas que se predisponham a formar pessoas.

Para que de fato possamos avançar na construção e utilização de ambientes virtuais de ensino aprendizagem que possibilite a formação das redes colaborativas é necessário arriscar mais; se permitir expor o cotidiano de nossas práticas, de nossas buscas, de nossas incertezas. Só assim será possível incluir o outro que também está buscando e também possui incertezas. Aí sim, teríamos contextos de colaboração, onde seria possível compartilhar o significado das ações, numa negociação permanente, que permitisse estabelecer acordos sobre as responsabilidades, as disponibilidades, os compromissos individuais e coletivos, estabelecer consenso sobre as formas de trabalho e de aprendizagem. Creio que não devemos idealizar a ação coletiva como algo harmonioso, pois na verdade iremos nos deparar com as diferenças, as distâncias, os ressentimentos, enfim, com o humano. De nada adianta defendermos a inclusão social, trabalharmos com as teorias mais avançadas sobre pensamento complexo, multiculturalismo, formação de competências, ou com as ferramentas mais sofisticadas de alta velocidade se não rompemos com as distâncias cotidianas de nossos contextos de vida.

Considero que os recursos tecnológicos por si mesmos não trazem as “janelas de significação”, pois essas podem não ser percebidas no nosso cotidiano. Portanto, a Internet potencializa, na maioria das vezes, as relações sociais já existentes, sejam essas isoladas ou colaborativas. O sujeito da aprendizagem se modifica com as novas tecnologias, assim como as tecnologias modificam com o uso que delas é feito. A interface dos ambientes virtuais de aprendizagem consiste em um modelo de organização da informação que permite a organização do pensamento e das estratégias de comunicação, mas ainda temos que aprofundar nos nossos contextos de trabalho em que grau o uso das tecnologias afetam os hábitos de ensino e aprendizagem, assim como os significados que partilhamos sobre a ação educativa.





Referências Bibliográficas

ALAVA, Séraphin e colaboradores. Ciberespaço e formações abertas – rumo a novas práticas educacionais? Porto Alegre, Artmed, 2002.

ASSMANN, Hugo e MO SUNG, Jung. Competência e sensibilidade solidária. Educar para a esperança. 2A.ed. Petropólis: Vozes, 2001.

CORRÊA, Juliane. Novas tecnologias da informação e comunicação no contexto da formação continuada a distância. Revista Perspectivas em ciência da Informação. Belo Horizonte,V.5, n.2, p.267-273, jul/dez.2000.

CORRÊA, Juliane. Novas tecnologias da Informação e Comunicação e/ou novas estratégias de ensino aprendizagem (no prelo).

HARGREAVES, Andy. Os professores em tempo de mudança. McGrawHill. 1998.

MERCER, Neil e ESTEPA, Francisco Gonzáles. A EAD, o conhecimento compartilhado e a criação de uma comunidade de discurso internacional. In: LITWIN, Edith. Educação a distância – uma nova agenda para o debate educacional. Porto Alegre: Artmed, 2001.

SILVEIRA, Sérgio Amadeu da. Exclusão digital – a miséria na era da informação. SP: Editora Fundação Perseu Abramo, 2001.

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